sábado, 8 de novembro de 2014

Saint Laurent (2014)

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Saint Laurent de Bertrand Bonello é o candidato francês ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro e foi um dos filmes de abertura do Lisbon & Estoril Film Festival deste ano - exibido Fora de Competição - e que contou com a presença do realizador na apresentação do mesmo no Centro de Congressos do Estoril.
Yes Saint Laurent. Um nome, uma marca. Nos bastidores das grandes passerelles internacionais conhecemos o homem Saint Laurent (Gaspard Ulliel), a sua concepção profissionalmente perfeita onde pretende apenas criar o belo. Ao mesmo tempo, conhecemos o outro lado do brilho... Saint Laurent, o homem de paixões, de entregas e de excessos que o marcaram para toda uma vida.
Depois de L'Apollonide (Souvernirs de la Maison Close), o realizador leva o espectador numa viagem que passa, uma vez mais, pelo imaginário de uma vida sexual fechada aos olhares do público, por meandros sempre obscuros e altamente dependentes da satisfação que é consagrada àqueles que nela participam mas, em vez de abordar toda uma alta classe parisiense, Saint Laurent é um retrato das vivências escondidas dessa mítica figura da moda internacional que foi Yves Saint Laurent. Aqui conhecemos YSL o génio da moda que redefiniu as formas femininas através de linhas e cortes direitos e acentuados desprovendo a mulher de uma imagem tradicional que se definira ao longo de anos dando-lhe agora todo um novo toque de uma sensualidade sóbria e distinta.
No entanto, este filme é também, como referi, uma viagem ao outro lado do brilho e do estrelato, da opulência e do estilo fazendo o espectador cair na subversão e na anarquia pessoal de uma vida dupla que poucos conheceram, onde o desgaste e a depência psicológica das velhas memórias de um passado e de amores mais ou menos perdidos e a física graças a alucinogéneos que condenaram toda a vida de Saint Laurent são apenas o início de uma espiral de decadência iniciada largos anos antes aquando do seu esgotamento nervoso durante o cumprimento de serviço militar na guerra da Argélia.
Bertrand Bonello e Thomas Bidegain assinam assim um argumento que para além de nos remeter para os anos de maior fama e ascenção do estilista francês - 1967 a 1976 - mas também sobre a sua vida paralela onde a criação e a inspiração sempre foram uma constante como forma de dignificar a forma e o corpo feminino ao mesmo tempo que os seus dramas pessoais o levavam numa espirar de decadência onde orgias, recurso a prostituição masculina e drogas pesadas consumiam a sua, por vezes, pouco estável vida sentimental e afectiva. Bonello filma então os extremos, os excessos e a ténue linha que separa a luz da escuridão, a sanidade de uma certa loucura que é o mesmo que dizer a vida tida segundo os padrões ditos "morais" da época e aqueles que são, na prática, aplicados e que normalmente pouco estão relacionados com os anteriores.
A dar vida a este homem temos um inspirado Gaspard Ulliel tão enigmático, controverso e sexualmente explícito como aquando da sua interpretação como "Hannibal "Cannibal" Lecter" em Hannibal Rising (2007). Se este último filme lhe granjeou o conhecimento internacional, Saint Laurent será certamente o filme que o vai confirmar como um dos actores franceses do momento e a interpretação será "aquela" que durante muitos e longos anos precisará de ser superada. O seu olhar aparentemente calmo contrasta com alguma provocadora perversão que insinua e uma afectividade que procura sem conseguir confirmar em absoluto.
Num misto de notáveis interpretações secundárias onde se destacam Valérie Donzelli como a tia que Saint Laurent gostava de "modelar", Jasmine Trinca como uma das amigas da alta sociedade ou Valeria Bruni Tedeschi como uma mulher apagada que num instante ganha uma nova vida graças às suas palavras, Saint Laurent destaca-se ainda pelas interpretações de Jérémie Renier como "Pierre Bergé", o companheiro de vida - e de profissão - do estilista, Louis Garrel numa intensa interpretação como "Jacques de Bascher", o eterno "objecto" de desejo de Saint Laurent e ainda Léa Seydoux como "Loulou de la Falaise" designer de jóias e fiel amiga do estilista.
Todos eles encarnam um espírito típico da época saído do "free love" e num misto de decência herdada da era De Gaulle e a loucura dos anos 70 onde tudo tinha de ser vivido e com alguns excessos, fazem com que Saint Laurent insira o espectador num palco por vezes louco e sedutor - muito graças a uma excêntrica direcção de fotografia de Josée Deshaies - mas repleto de riscos que todos eles viveram (in)conscientemente.
Com um design de produção de Katia Wyszkop e um guarda-roupa coordenado por Anaïs Romand, Saint Laurent poderá não ser o filme francês do ano mas será com toda a certeza um dos mais marcantes.
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8 / 10
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